O ESPETÁCULO
Sua cidade natal, porém, está irreconhecível aos seus olhos, devido às obras de saneamento que dariam origem ao Canal do Mangue, no Centro. A alusão às reformas urbanísticas que tomaram o Rio nos últimos anos (e sua eventual gentrificação por consequência) é inequívoca, mas, felizmente, desprovida de qualquer ranço de didatismo ou panfletagem. Outras reflexões, no entanto, vêm à tona no texto, de tal maneira imbricado com a encenação — e nisso reside grande parte da força avassaladora da montagem — que é até difícil imaginar o conteúdo em outra forma. Na direção de Marco André Nunes, diálogos, palavra recitada, elementos de performance e trilha executada ao vivo (pelo diretor musical Felipe Storino, com Maurício Chiari e Kosovski) se cruzam de forma orgânica. A fascinante instalação cênica que abriga a trama (concebida por Nunes e iluminada com esmero por Renato Machado) sugere a crueza suja do mangue em uma caixa de areia e em uma gaiola de caranguejos. Completado por Eduardo Speroni, Alex Nader, Fellipe Marques e Carolina Virguez, o elenco exibe notável entrega e, para além de destaques individuais, uma extraordinária noção de conjunto.